Quando um mafioso constrangeu a Rede Globo
Antes de mais nada, é importante saber que MÁFIA é um acrônimo para Morte Alla Francia, Italia Anela, que significa Morte à França, Itália avante! Embora hoje tenha se tornado não apenas um substantivo feminino, como também derivou outro substantivo para o membro de “uma máfia”, o mafioso.
Máfia é, segundo dicionários brasileiros, um substantivo que significa organização secreta de malfeitores. Essa organização surgiu na região italiana da Sicília, sendo a mais famosa a Cosa Nostra (Coisa Nossa), mas havia também a napolitana Camorra e a calabresa ‘Ndrangheta.
A máfia espalhou-se pelo mundo, chegando também nos Estados Unidos, inclusive em Hollywood, o que fez ser tema de vários filmes, como o clássico O Poderoso Chefão.
O descendente de italianos Alphonse Gabriel “Al” Capone foi um dos mais famosos mafiosos estadunidenses.
Mas o que isso tem a ver com constranger a Rede Globo na década de 1980, que na época era a mais poderosa rede de tevê do Brasil?
Para explicar isso, preciso contar a história de um italiano nascido em 13 de julho de 1928, na cidade de Agrigento, Sicília, que se tornou um dos mais importantes membros da Cosa Nostra que, após levar sua máfia para os Estados Unidos, acabou se arrependendo e aceitando colaborar com a Justiça daquele país norte-americano.
Ao delatar companheiros e informar toda a estrutura da organização, incluindo os esquemas de corrupção envolvendo políticos daquele país, o mafioso siciliano virou notícia internacional, quando precisou ser apresentado nos telejornais da rede de tevê brasileira, principalmente no Jornal Nacional, líder disparado de audiência na época, sendo assistido por famílias cheias de pudores no país do Carnaval de bundas e seios de fora.
O mafioso arrependido ou traidor, como queira chamar, teve origem muito pobre e, para sair da pobreza, recorreu às atividades ilegais.
Casou-se aos 16 anos e, ainda jovem, devido às suas atividades ilegais, recebeu o apelido de Don Masino, sendo reconhecido por esse nome até em Palermo.
Decidiu mudar-se para Nápoles e, ao fim da Segunda Guerra Mundial, foi para Buenos Aires, mas acabou retornando para Palermo (que pouco tempo depois ficou famosa como a capital mundial da heroína) devido à falta de dinheiro.
No retorno à Itália, já na década de 1960, o mafioso se envolveu com a família Rigotto e começou a investir no contrabando de tabaco. Mais tarde, ao ser caçado pela polícia italiana, usou várias identidades falsas e casou duas vezes, fugindo para Estados Unidos, México e, finalmente, veio para o Brasil, quando foi preso em Itapema, Santa Catarina, em 2 de novembro de 1972, quando foi extraditado para seu país.
Lá na Itália foi condenado e preso. Depois de cumprir a pena, já no começo da década de 1980, foi para o Paraguai e novamente veio para o Brasil, época em que começou a traficar drogas.
Mas, afinal, como ele constrangeu a Rede Globo? Simples, apenas obrigando ao telejornal citar seu nome, quando os apresentadores Celso Freitas e Cid Moreira tiveram que falar da prisão e do histórico de Tommaso Busquetta.
O problema é que o nome dele era Tommaso Buscetta, que é falado Tomazo Buxeta, mas isso a Rede Globo não poderia fazer, não poderia chocar seus telespectadores com um palavrão desse!
Então o mafioso se transformou num tal de Tommaso Busquetta que estava preso nos Estados Unidos e blá, blá, blá!
Buscetta ficou famoso como o traidor, tendo até um filme — uma coprodução ítalo brasileira com apoio da ANCINE (Agência Nacional do Cinema), em associação com Telecine e Canal Brasil — que conta a sua história, lançado em 2019, com destaque para a atriz brasileira Maria Fernanda Cândido, além de uma pequena participação de Jonas Bloch. O papel do traidor é feito pelo italiano Pierfrancesco Favino, que esteve também em Guerra Mundial Z, Anjos e Demônios e Rush – No Limite da Emoção.
Buscetta faleceu em 2 de abril de 2000, aos 71 anos, na Flórida, Estados Unidos.
O filme O Traidor está disponível no Telecine, sendo possível assistir no Amazon Prime Video.